Tem bom coração. No fundo é bom, tem aqueles ataques de loucura,
mas no fundo é boa pessoa.
Não foi assim
educado. Não? Houve sempre tanta violência em casa.
É um filho da mãe
do pior.
A dualidade existiu
muito para lá do razoável.
Difícil a
condenação sem perdão, que não houve, até um dia. Atenuantes,
sim. Sem explicação.
Era alcoólico,
mentiroso, mau carácter, vigarista, sem honra.
Era o irmão que
mais gostava, o outro já tinha morrido.
Na véspera,
tínhamos combinado ir ao cinema, mas o telefone, nesse dia, não era
atendido e resolvemos passar pela casa deles, não fosse ter a conta
por pagar.
Quando nos viu ficou
atarantado.
Que a mulher estava
deitada com uma enxaqueca, não podiam ir ao cinema...mas quis vê-la.
O quarto estava na
semi-obscuridade, ela tapada até ao queixo. Sentei-me na beira da
cama, os olhos a habituarem-se à penumbra, enquanto lhe perguntava
como se sentia. Foi quando respondeu que lhe doía o corpo todo que
vi a cara toda negra e num repelão puxei o lençol para trás.
O corpo dela tinha
sangue pisado por todo o lado. Chorava envergonhada.
Ela estava
envergonhada, céus e eu numa fúria descontrolada, estava tão mas
tão envergonhada, por ele, por mim, por o ter como irmão, por não
conseguir voltar-lhe as costas definitivamente.
Essa dualidade
existiu durante muitos anos, demasiados anos, até um dia.
Então houve o
corte, sem apelo nem agravo.